Percival Puggina - Hugo Motta e a crise institucional

Percival Puggina – Hugo Motta e a crise institucional

Opinião Percival Puggina

Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org),
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia;
Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.
“As opiniões expressas neste artigo/coluna são de responsabilidade exclusiva do autor
e não refletem necessariamente o ponto de vista deste veículo.”

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Falando à Associação Comercial de São Paulo, Hugo Motta, presidente da Câmara dos Deputados, mencionou o PL da Anistia e sublinhou a necessidade de “na solução desse problema, que é sensível, que é justo, nós não aumentarmos a crise institucional que já estamos vivendo”. O pior sobre essa frase é ter sido proferida sem causar escândalo, sem arrancar murmúrios da plateia nem indagações dos repórteres.

Infeliz passo a passo nos trouxe até este momento histórico, quando ouvimos de alguém com tamanha responsabilidade e poder que a Câmara dos Deputados agravará uma crise institucional se aprovar lei em matéria de sua exclusiva competência! Que estado de direito é esse, cujo Poder Legislativo pisa em ovos para que as instituições não desabem, para que “a crise não se agrave”? Quando foi que o Direito do país ficou como o direito do anzol, torto para capturar os peixes de cada temporada?

Uma dúzia de anistias foram concedidas desde o período do povoamento até a proclamação da República. Elas ocorreram em todas as etapas de nossa história, tanto com o Brasil na condição de estado ultramarino português, quanto durante o vice-reinado e no Reino Unido. Com a Independência, o instituto da anistia ganhou hierarquia constitucional sendo usado com frequência após movimentos separatistas ou revolucionários. Essa tradição se prolonga no período republicano, com pelo menos uma dezena de anistias sendo concedidas em momentos de fracassos da política e apelos à violência. Anistias nunca deram causa a “agravamento de crises”! Ao contrário, foram conquistadas para a paz e se firmaram como instrumentos eficazes de pacificação, com cada macaco no seu galho. Anistia é instrumento da Política e não da Justiça!

Em artigo para Zero Hora de 7 de abril de 2014, o ministro aposentado do STF, Paulo Brossard, escreveu que “a anistia é de aplicação instantânea e imperativa, independente de quererem ou não seus destinatários”. Noutro ponto, acrescentou o saudoso rio-grandense que “ela não se funda na Justiça, mas na temperança, no esquecimento, e particularmente na paz que a juízo da lei se faça aconselhável”. A lei, como convém saber, é produto do poder político, do Congresso Nacional, no caso.

Salta aos olhos, portanto, que uma situação institucional somente se agravará, com a aprovação de uma lei de anistia, se essa situação já for absolutamente anômala, desarmônica, de exceção e não estável. Quando se ergueu por meios próprios ao protagonismo político, a atual composição do STF entortou o anzol e passou a usar o Direito como instrumento da Política. E essa política não é a da direita nem é a do centrão, se me faço entender. Seus porta-vozes no Consórcio Goebbels festejam a existência de pelo menos três desses instrumentos casuístas, já estudados para “revogar a anistia” … São verdadeiros anzóis, para caprichosa escolha do mais adequado a capturar esse peixe quando descer as corredeiras do Legislativo e chegar ao STF, que jamais deveria se imiscuir em atos soberanos eminentemente políticos e notavelmente constitucionais.

Talvez convenha que os presidentes das duas casas do Congresso meditem sobre estes versos de Edmond Rostand em Cyrano de Bergerac:

Na esperança de ver nos lábios dum ministro
sorriso que não tenha uns longes de sinistro?
Almoçar cada dia um sapo — e não ter nojo?
Gastar o próprio ventre a caminhar de bojo?
Trazer os joelhos encardidos?
Exercitar a espinha em todos os sentidos?
Não, muito obrigado!

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